Na abertura, um escritor e um neurocientista refletiram sobre os dilemas enfrentados nos experimentos medicinais.
Rompendo barreiras e quebrando tabus em busca do esclarecimento do uso da cannabis como um novo medicamento para os mais diversos tipos de doenças. “Cannabis: da droga ilícita à planta companheira”, foi o tema da noite de segunda-feira (27/9) na abertura do Simpósio Multidisciplinar de Cannabis Medicinal, realizado virtualmente pela parceria entre pesquisadores da Unesc, Univali e Unisul.
Antes do bate papo com os convidados, os organizadores fizeram uma homenagem in memorian ao pesquisador e pioneiro no estudo da utilização da cannabis e de outras substâncias psicotrópicas como tratamento terapêutico, Elisaldo Luiz de Araújo Carlini. “Nós estamos estudando a maconha que o homem usa, isto é um erro, devemos estudar o homem que usa maconha” defendia Carlini.
Para a abertura do simpósio foram convidados dois palestrantes. Um deles, o jornalista Denis Russo Burgierman, é autor dos livros “O Fim da Guerra” e “Piratas no Fim do Mundo”. Deis foi diretor de redação das revistas Superinteressante e Vida Simples e comandou a curadoria do TEDx Amazônia, em 2010. Também é roteirista do Greg News.
Outro palestrante da primeira noite do simpósio foi o neurocientista Sidarta Tollendal Gomes Ribeiro, que também é biólogo, professor titular e vice-diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Autor de “O Oráculo da Noite: A história e a Ciência do Sonho”, lançado em 2019, ele é articulista do jornal Folha de São Paulo.
O jornalista Denis Russo iniciou sua fala trazendo como referência a definição do neurocientista Sidarta (o outro convidado da noite) que diz que “a maconha é o cachorro do reino vegetal”. “Como cachorro, a cannabis é uma invenção humana. A partir das nossas necessidades, a gente foi selecionando tanto uma espécie como a outra, para atender a diversidade imensa de necessidades que a gente tem. São dois seres vivos que existem em uma quantidade imensa de variedades”, comentou.
O escritor prosseguiu com a sua comparação. “E a cannabis tem uma quantidade gigantesca de variedades, que atende uma quantidade gigantesca de gostos e modos de utilização”, ponderou. “Agora, estamos conhecendo uma explosão do uso medicinal e terapêutico da cannabis. Às vezes parece mentira, meio impossível, como é que uma mesma planta pode ser útil para cólica menstrual, autismo, insônia, ânsia e dor dos tipos mais diversos, inclusive dores psíquicas. Soa meio absurdo falar dos seus benefícios”, enfatizou.
Para o pesquisador e neurocientista Sidarta Ribeiro, estamos diante de uma compreensão que “tem cara de hippie, mas tem a solidez da descoberta do sistema endocanabinoide”. “O assunto ainda não entrou no livro-texto da escola médica do Brasil, mas já revolucionou completamente a compreensão sobre o corpo e como isso começa a se transformar numa nova indústria, numa nova velha medicina, numa nova maneira de lidar com velhos estigmas, na necessidade de desfazer velhos estigmas”, observou.
Sidarta pontuou, ainda, a forma como o Brasil encara o uso medicinal da Cannabis. “O Brasil está pagando o preço de muitas décadas de ensino sucateado e a gente tem a revolução do uso terapêutico da cannabis acontecendo no momento em que o país está sendo profundamente questionado na sua capacidade de formação de novas gerações, na sua capacidade de manter o seu parque científico tecnológico e seu plantel de cientistas. Um momento em que o Brasil está passando por um risco existencial”, analisou.