Psicóloga Jéssica Horácio – CRP 12/14394 – Psicoterapeuta Corporal e Tanatóloga
Se você tiver a oportunidade, pergunte aos seus pais e avós como era a qualidade de vida deles quanto tinham a sua idade. Escute a história que eles têm para contar, observe as prioridades deles na época, os objetivos de vida que tinham, as preocupações e valores morais que faziam parte do seu dia a dia. Pergunte também sobre as condições físicas, financeiras, emocionais e culturais.
Dentro do desenvolvimento saudável do ser humano, é necessário que em um dado momento da sua infância ele consiga se distinguir da mãe e do pai. Quando essa desfusão não acontece o indivíduo cresce acreditando que o jeito de viver dos pais é o único no mundo e que portanto, é o seu também, ele constrói então uma simbiose relacional onde ele e o pai ou a mãe são a mesma pessoa.
Então, se este processo não aconteceu naturalmente, quando adultos podemos conhecer a realidade dos nossos familiares para nos ajudar a separar a história deles da nossa. Há pessoas que carregam por gerações a fio uma crença que é altamente prejudicial para os dias atuais, mas que por nunca ter sido questionada, acaba se tornando uma regra fixa.
A valorização do trabalho e dos esforços para conquistar coisas, espaço e poder demonstram esta situação sistêmica. Ás vezes existe uma identificação tão intensa com a história passada dos próprios familiares que a pessoa sem perceber, acaba reproduzindo o mesmo modo de viver de alguns membros da família: buscam os mesmos empregos, os mesmos salários, a mesma satisfação ou insatisfação, e até mesmo os mesmos desgastes físicos, mentais e emocionais.
Algumas pessoas relatam:
“Mas eu aprendi com o meu pai a viver pro trabalho”
“Mas a minha mãe disse que descansar é coisa de vadio e de quem não quer nada com a vida”
“É como a minha família sempre diz: ‘Agora é a hora de eu produzir e render pra um dia poder descansar na velhice’”…
Neste sentido, há famílias que cultuam o esforço e o sofrimento no meio profissional, nem se questionam sobre o porquê, até porque acreditam que sofrimento e trabalho estão ligados sendo impossível quebrar esta relação. São pessoas que aprenderam a viver somente para suprir as necessidades mais primitivas da vida, e que precisaram negligenciar as próprias emoções em prol da sua existência. Não podiam sentir medo, sono, cansaço porque a vida exigia pressa e produtividade, logo, tiveram que inconscientemente bloquear os seus sentimentos e viver como se fossem máquinas. E mesmo que os anos se passem, continuam vivendo desse jeito: se culpam por descansar, quando pegam férias se cobram, sentem vergonha de admitir as suas vulnerabilidades, desenvolvem crises de ansiedade e adoecem quando param de trabalhar…
E então aquela crença de que “um dia vou descansar” não se concretiza uma vez que não se aprendeu a descansar, não se autoriza a sentir prazer e ter momentos de lazer.
É por isso que te questiono: Qual o sentido que a vida profissional tem para você?, e este sentido, foi você quem criou ou ele foi construído por alguém que não é você?
Se apropriar dos nossos objetivos na vida é uma forma de fortalecer a nossa identidade e obter mais satisfação no nosso dia a dia, é dessa forma que conseguiremos separar a nossa história de vida daquela que nossos familiares tiveram.
Então, te sugiro refletir sobre a possibilidade de viver para além do trabalho, em construir outros papéis na sua vida tão importantes quanto o de profissional. A qualidade de vida é conquistada quando permitimos que cada área da nossa vida tenha uma representação saudável e compatível com a realidade: ser pai, mãe, profissional, amigo, filha, neto, estudante, merecem espaço na nossa história, e podem nos abrir um novo mundo de possibilidades e, de crenças, porém agora, autorais, personalizadas por nós mesmos e com base nas nossas próprias experiências.