Não procuro explicar nada com minha poesia
Com meus ritmos, desritmos, falsa harmonia
Ou insípida filosofia
Um poeta que explica, nada enuncia
Nada pronuncia
Nada denuncia
Nada, na verdade, evidencia
O poeta precisa, tão unicamente
Complicar o dia
Enrolar os sentidos
Desmitificar
Desmistificar
Construir novos e intrépidos
Mitos
De ousadia
Senão, de que adiantaria
Criar a poesia
Para encher de respostas
Quem sequer sabe o que duvida
A poesia é assim
Desmedida
Descabida
Estonteantemente iludida
Mas sem ela, o que seria da vida?
Um canto sem som?
Uma cor sem semitons?
Uma música sem melodia?
Uma poesia que a tudo explica
Nada diz, nem encanta
Não é ciência, não é magia
São letras em branco num papel amassado
Um xingamento sem asas num muro qualquer
Um palavrão arrependido
Quando uma risada bem sorrida
Poderia acabar com uma guerra
E, em vez do ódio
Trazer-nos alegria.