Às vezes eu ouço vozes e as vozes dizem assim:
“Professor, por favor, demita-se. Você doutrina nosso jovem rebanho acéfalo, você não vê? Observe as falas na internet de todos os verdadeiros entendedores, professor, por favor, demita-se.
Professor, porque você tanto reclama do seu salário? Professor, você vê advogado reclamar? Você vê médico reclamar? Você vê engenheiro reclamar? Você vê tanta gente assim reclamar? Professor, demita-se.
Aliás, professor, você trabalha quantas horas por dia? Quantas horas por semana, professor, você trabalha finais de semana? Professor, até o governo reconhece que qualquer um com notório saber pode ser professor. Professor demita-se.
Professora, porque tanto reclamas? Professora, você não trabalha feriados, não é mesmo? Professora, se é tão ruim assim, porque não trocas de profissão professora? Aliás, professora, você já foi costureira, faxineira, empacotadeira, diarista, já trabalhou em frigorifico, em olaria, em padaria, professora? Professora, se está tão ruim, pede pra sair, vai.
Professora, professor, porque tanto vocês reclamam? Vocês escolheram cuidar de nossos pequeninos para que seus pais possam trabalhar, parem de reclamar, professor, professora. Os pais não podem ir à escola saber de seus filhos, mas vocês professores escolheram isso então devem aguentar. Professor, professora, pare de reclamar!
Olhe na tevê, professor, está vendo? Está vendo que ninguém mais quer ser professor, ninguém mais quer ser professora, então pare de reclamar, afinal quem vai cuidar de nossas crianças, professora?
Professora, vai fazer mais curso, para quê? Professora, trabalhar no verão? Vai descansar professora, aproveita as férias que muitos não têm e pare de reclamar que está sem salário, professora. Porque você não guardou durante o ano todo, professora.
E professor, professora, querem saber? Parem de ser vítimas, parem de se vitimizar. Parem com esse papo de que gostam do que fazem, de sonham com um futuro melhor, professores. Vocês são trabalhadores assim como operários, então parem de sonhar.
Não estão contentes? Professores, demitam-se…”
As vozes se articulam, se confundem nas ideias mais confusas ainda, mas ecoam concretamente numa verborragia ardida…Esses tempos de tantas verdades são apavorantes…