Faz tempo que o tempo passa, faz tempo que o tempo passou e passou aqui por casa, bateu na minha porta e eu atendi. O tempo passou também em tua casa e na tua porta também bateu, tua campainha apertou ou mesmo bateu palmas e gritou: “ô de casa?!”. E você atendeu.
Faz tempo que o tempo passou. Faz tempo que o tempo passa.
Foi ontem, logo ali na esquina da memória. Um churrasco em família, ou foi o casamento de um primo ou prima? Quem se lembra? Talvez tenha sido um velório ou quem sabe era dia de finados e todo mundo vai no cemitério para lembrar que o tempo continua passando. Daí na volta do cemitério se passa lá na casa da vó ou da tia para comer umas bolachinhas, rir e relembrar mais uma vez que o tempo passa.
Faz tempo tudo isso.
Ano passado, talvez dia dois de novembro, quem se lembra ainda? Só o que se pode confirmar é que faz tempo. “Esses dias atrás”, a gente diz, como se fosse há apenas quinze dias. Então a memória traiçoeiramente nos recorda que “esses dias atrás” já tem dois anos e três meses. Um primo descasou, outra prima se juntou, a filha do tio João já tem dois filhos e o tio João já é vô também.
Faz tempo. E só sabemos disso.
Foi no churrasco na casa de um amigo, ou na formatura do terceirão. Ou será que foi na formatura da faculdade? Bem, pode ter sido quando trabalhei naquela empresa lá naquela cidade lá. Ou também pode ter sido na última eleição. Quem pode saber. Só podemos afirmar que faz tempo.
Faz tempo inclusive que não tomamos Mirinda, Minuano Limão ou Quik. Aliás, é assim que se escreve? Qual foi a última vez que você empinou pipa? Faz tempo que você cresceu, não é mesmo?
Faz tempo que o tempo mudou também. Uma vez as coisas de “uma vez” tinham um tempo bem pretérito, tipo, coisa da época do bisavô do meu pai. Hoje o “antigamente” é coisa de pouco mais de dez anos atrás, logo ali.
Faz tempo que o tempo vem correndo, não é mesmo? Ou será só nossa percepção de tempo? Nesse mundo doido parece que nunca temos tempo para visitar os amigos de verdade, para se dedicar de verdade às coisas de “verdade”. A tecnologia nos aproximou tanto que nos deixou sem espaço entre nós. A falta de espaço é tão grande que queremos cada vez mais é ficar longe de todos. Faz tempo que penso isso e faz tempo que não consigo fugir disso também.
Faz tempo, eita se faz. Será que um dia nos daremos conta de quanto tempo nos falta?