Psicóloga – CRP 12/14394
O final do ano traz consigo a proposta de deixar para trás os incômodos do ano que passou, e construir novas alegrias no ano que se aproxima. Nesta época do ano existe uma ideia de que todos os problemas ficarão para trás assim que os ponteiros do relógio passarem da meia noite. É como se a partir do início do novo ano os problemas automaticamente sumissem, como se falássemos: “Deixa pra lá”, e os problemas passassem então a não influenciar mais os nossos comportamento e os nossos sentimentos durante todo o novo ano.
Esta ideia pode funcionar para as pessoas que realmente precisam de um motivo para finalizarem ciclos pois, desta forma justificam as suas escolhas – o fim de determinadas situações – baseadas em uma crença universal de que ano novo implica em comportamentos novos. Essa crença pode ser muito positiva porque pode impulsionar a tomada de decisões, porém pode mascarar o medo de enfrentar a responsabilidade pessoal na origem de determinados problemas.
Assim, é importante compreendermos que quando nos machucamos, não curamos a ferida pedindo para que ela pare de doer porque é ano novo. E que nesse caso a ferida continuará doendo apesar do ano ter passado, mesmo que num primeiro momento ela esteja dormente devido ao anestésico da “promessa de ano novo”.
Situações como esta são um exemplo de como algumas pessoas funcionam:
- Buscam justificativas externas para suas tomadas de decisões,
- Quando sentem-se cansadas imaginam um contexto mais prazeroso e desistem de compreender o porque do seu cansaço, e deste modo, não refletem sobre as possibilidades de descansarem ao invés de iniciarem um novo ano na ilusão de fazerem diferente, e inconscientemente reproduzirem os mesmos comportamentos.
Por isso é tão importante ter discernimento e cautela para não se tornar um indivíduo compulsivo por motivos para “deixar pra lá”, e que desistem de enfrentar as adversidades preferindo buscar novas alegrias.
Quando surge o questionamento sobre: Descansar ou desistir, algumas pessoas consideram que a resposta para essa pergunta corresponde em avaliar a importância de tal situação na vida da pessoa. Ou seja, partindo desse pressuposto, quando desistimos de algo é porque aquilo não era realmente importante para nós, e quando descansamos de um estresse mas retomamos o fôlego significa que agimos deste modo porque consideramos que aquilo é realmente importante para nós.
Essa resposta seria correta caso não nos boicotássemos tanto diante das nossas escolhas. Não somos tão práticos e previsíveis assim, o ser humano é extremamente complexo e para evitar sofrer desenvolve mecanismos inconscientes que o boicotam e o conduzem a uma escolha que a princípio é menos dolorosa. Nenhum conflito é solucionado sem a elaboração deste, ou seja, mesmo que se busque novas alegrias, enquanto o comportamento antigo que contribuiu para a origem do problema não for aceita, compreendida e transformada, as novas alegrias se contaminarão pelos velhos comportamentos, se transformando assim em um circulo vicioso.
Talvez, no último dia do ano, ao invés de descartarmos os problemas do ano que está acabando, buscássemos compreender o porque deles terem acontecido, rever o que está nos levando a desistir de cada um deles – compreendendo que quando desistimos de algo porque consideramos ruim ou negativo para nós, desistimos também de transformar este ruim em algo bom, abdicamos da nossa capacidade de te resiliência e de aprender a enfrentar algumas batalhas. Não precisamos ganhar todas as batalhas, mas podemos reconhecer quais valem a pena se lutar para não sermos vencidos por elas mais adiante.
Lembre-se: A gente só consegue “deixar pra lá” quando compreende a responsabilidade pessoal na origem do problema, exceto isso, é como se esperasse que o problema desaparecesse porque o ano novo está se aproximando. Portanto, antes de desistir, reflita se você já descansou o suficiente. E saiba que: “Tudo aquilo que não enfrentamos em nós mesmos encontraremos mais adiante e chamaremos de destino” (Jung). Pense nisso!