País entrou na 29ª semana epidemiológica, momento em que a doença atingiu o ápice em outros países.
Após mais de 80 dias desde o início da quarentena e das orientações de cuidados individuais e coletivos para evitar a contaminação e a disseminação do coronavírus, há um retorno gradativo às atividades. Os especialistas ainda não sabem com 100% de assertividade qual o comportamento do vírus nos próximos meses, mas as análises de cenário têm permitido algumas projeções, como por exemplo, o pico da pandemia no Brasil para as próximas semanas.
O professor doutor e pesquisador da Unesc, médico intensivista, pneumologista e membro da equipe responsável pela elaboração das Diretrizes para Diagnóstico e Tratamento da Covid-19, divulgadas pelo Ministério da Saúde, Felipe Dal Pizzol, comenta que a pandemia do coronavírus é a maior da última década e que está desafiando a humanidade. “Muito rapidamente ela se espalhou pelo mundo causando milhares de mortes. Como as outras pandemias virais, com exceção do HIV, não há um tratamento efetivo até que se desenvolva a vacina. Há algumas perspectivas, mas na prática ainda não se dispõe de nada”, afirma o pesquisador.
Ainda a respeito da Covid-19, Dal Pizzol pontuou alguns itens como pico da pandemia, tratamentos em estudo, o aprendizado do Brasil com os outros países, a situação diferenciada de Santa Catarina e a necessidade de observar as orientações de segurança individual e coletiva:
Pico da pandemia
O pico epidêmico é o ponto mais alto na curva de infecção – a partir dele o número de novos casos tende a se estabilizar ou diminuir. O professor da Unesc afirma que, analisando o comportamento da pandemia em outros países, percebe-se que o pico se deu em torno da 28ª a 30ª semana epidemiológica e o Brasil entrou esta semana em sua 29ª.
Dal Pizzol afirma que é difícil fazer uma projeção do pico do coronavírus, mas que ao se analisar o número no Brasil e o histórico de outros países, a persistência do não aumento de casos, sugere que tenhamos chegado muito próximo ao pico. Segundo o professor da Unesc, entre a 28ª a 30ª semana em outros países foi quando a doença começou a entrar no pico e depois, os números começaram a decrescer. “A impressão que se tem olhando o Brasil e o que aconteceu em outros países é que a tendência é a de que a gente atinja o pico nas próximas semanas e esse platô se estenda por três ou quatro semanas, e a partir daí comece a reduzir o número de casos”.
O Sul do Estado seria, neste contexto, uma exceção, devido aos baixos números de casos e de contágio no comparativo com outras regiões. O comportamento nos próximos meses ainda é incerto, mas segundo o professor da Unesc, há tanto a possibilidade de se ter casos espalhados por um período maior de tempo quanto a possibilidade de as baixas temperaturas contribuírem com um aumento do número de casos, levando o pico para o inverno.
“A minha aposta é em um cenário mais indolente, de casos vindo mais progressivamente, sem sobrecarregar o sistema de saúde. Estamos observando medidas para conter o vírus e temos uma condição diferente do resto do país, mas é preciso fazer uma análise de cenário a cada semana. Trabalhamos com projeções, mas é a análise do que demonstra se a projeção estava certa ou errada”.
Tratamentos em estudo
Por hora, dentre os estudos mais próximos de se tornarem realidade para o tratamento da população está uma vacina para o coronavírus, que está em desenvolvimento. Segundo Dal Pizzol, como não há comprovação se o vírus irá continuar a circular no mundo, à exemplo do Influenza, a vacina terá um impacto importante.
O professor cita também tratamentos que estão sendo desenvolvidos e testados e que há uma boa perspectiva de que pelo menos algum deles possa ter efetividade para o tratamento da Covid-19. Um deles é o antiviral remdesivir, medicamente ainda não existente no Brasil, mas que tem um estudo positivo demonstrando que consegue reduzir a gravidade da doença. O remdesivir preveniu doenças pulmonares em macacos infectados com o coronavírus, segundo um estudo publicado na revista médica Nature nesta terça-feira (9/6). Os testes do medicamento em humanos estão em andamento.
Existem ainda estudos que sugerem que o plasma convalescente (PC) coletado de pessoas que se recuperaram da Covid-19 possa ser benéfico para um grupo de pacientes, assim como alguns corticoides. “Estamos ainda muito aquém de ter uma evidência robusta de que esses tratamentos devam ser empregados para todos os doentes. Ainda temos uma caminhada e nas próximas semanas mais estudos virão para que tenhamos um tratamento que seja de rotina, que possa ser aplicado pelo menos para a maioria dos pacientes. Atualmente a gente consegue mais usar medicamentos em casos individualizados que tratar a população como um todo”.
Aprendizado com outros países
“Se existe benefício de estarmos no Brasil é que a gente aprendeu muito com outros países e todo o conhecimento gerado na China, Europa e Estados Unidos vai refletir no cuidado dos nossos pacientes agora. Os tratamentos que eles não puderam utilizar na época de pior número de casos, talvez possamos começar a aplicar na nossa realidade, tendo em vista que os casos no Brasil ainda são bastante expressivos”, afirma Dal Pizzol.
SC com números menores de casos
Comparando Santa Catarina a outros estados, a realidade da pandemia está mais “amena”, com taxa de casos e morte por milhões de habitantes menor comparativamente. “Tudo que se fez até agora como o distanciamento social e o fechamento de serviços não essenciais de maneira precoce e aderência da população aos cuidados teve impacto positivo e o nosso sistema de saúde não chegou a ficar sobrecarregado de maneira geral, só em alguns momentos”, comenta.
No entanto, o professor da Unesc chama a atenção de que é inevitável a continuidade do número de casos e de mortes com o afrouxamento do isolamento social e por isso, a necessidade de que o retorno às atividades seja feito gradualmente e da maneira mais segura possível. “Se for pensar em São Paulo, por exemplo, onde existem em torno de 2 mil pessoas na terapia intensiva e que vão demorar pelo menos um a dois meses para ter alta, mesmo com uma redução do número de casos novos, muitas pessoas vão morrer porque a doença costuma ter um quadro arrastado. As mortes e os casos após o pico da pandemia vão persistir, mesmo em número menor, e vamos ainda ter que conviver com isso nos próximos meses”.
Não afrouxar nas medidas de proteção
“Por melhor que a condição seja, talvez ela seja única e exclusivamente por conta das medidas de proteção. Sair o mínimo de casa, se sair usar máscara, manter 1,5 metros das pessoas e lavar as mãos com água e sabão ou higienizar com álcool 70 é o básico e isso vai valer até termos certeza de que o vírus não esteja circulando. A realidade é que é possível que tenhamos uma segunda onda de infecção mais fraca. E é difícil de prever se vamos voltar ao normal ou se a partir de hoje teremos esse novo normal”, afirma o professor da Unesc.