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Não ligo mais “na rádia”

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Wagner Fonseca, poeta, professor e blogueiro

“A rádia”, diriam os antigos, e gosto de recordá-los. Há um sentimento sincero quando vejo alguém de mais idade curtindo a AM, me traz a infância, me traz a lembrança de acordar todo dia as cinco e meia da manhã porque minha mãe já estava de pé e meu pai já atendia clientes na oficina que tiveram o azar de furar o pneu da bicicleta a caminho do trabalho. O trabalhador é quem ajuda o trabalhador, pensava.

Hoje não ligo mais “a rádia”, não me interessa a estação. Pouco muda do lamúrio religioso à repetição exaustiva da última moda musical. Perdeu-se o sentido (ou um sentido, ou vários).

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Ainda compro cd’s, é claro, quando possível. Adquirir discos de vinil já não posso mais. Aquilo que quase já havia desaparecido e quase estava esquecido, tornou-se objeto de uma suposta elitização cultural. Ainda guardo minha coleção de LP’s e ouço poucas vezes, confesso. Mas os preços exorbitantes dessa onda retrô são estúpidos, diga-se de passagem. O “retrô” parece apenas isso, uma suposta elitização. Pela incapacidade criativa de ir além volta-se ao esquecido como quem rememora apenas o lado bom da vida (ou será mesmo que é a “homenagem” ao passado?). Lembra muito o filme “Violação de privacidade”, com o finado Robin Williams: em seu túmulo brilhará apenas a verdade repetida sempre que alguém acessar a memória editada de seu ente querido, enquanto a mentira jazerá moribunda em algum arquivo digital ou simplesmente será eliminada, como todo lado ruim a esquecer.

Preserva-se o carro velho que o pobre não pôde ter (e não pode ainda hoje, muitas vezes!). Preserva-se o móvel antigo que cupim algum atacará. Retro-cedemos, mas não ascendemos aos cuidados com nossos idosos, também velhos e tão relíquias (necessárias!) quanto a “reliquização” de um determinado passado. A eles o radinho ainda toca na AM, para nós o rebuliço de nomes de duplas que parecem uma competição de torta na cara. Não se trata de ser contra a preservação, muitíssimo pelo contrário! Há toda uma glamourização que precisa ser discutida sim, mas para isso caberia outra discussão e Mario Sérgio Cortella já exemplificou muito bem em seu livro “Viver em paz, morrer em paz” como isso funciona, vale a leitura.

Coloco meu “velho” cd do Van Halen no player e meu filho agita os pés. Como muitos adolescentes em sua idade, me profere um tiro certeiro: “Eu queria ter nascido em outra época, quando havia música boa e ainda havia sentido”.

Faz sentido. No mundo em que vivemos sentido é o que mais faz. Inclusive faz falta também.


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